TELMA DE SOUZA QUER UNIR PT, PMDB, PSB E FORÇAS DE ESQUERDA
Em entrevista concedida ao jornal Boqnews, a deputada estadual Telma de Souza (PT) analisa seu novo mandato e as conjecturas políticas para o pleito municipal de 2012. A parlamentar disse que sonha com uma coligação em 2012 unindo o PT e o PMDB, legendas que nunca andaram juntas nas eleições santistas, apesar de estarem unidas no Governo Federal. Confira, abaixo, a matéria, assinada pelo jornalista Aldo Neto.
JB- Você está retornando a Assembleia Legislativa após 23 anos. Percebeu alguma mudança?
Telma de Souza- Com certeza. Há muito mais agilidade na estruturação das demandas. Eu venho da Câmara Federal, onde existiam 513 deputados, e agora lido com 94 deputados estaduais. Com isso, chega rapidamente a hora de falar no pequeno e no grande expediente. Em Brasília, eu chegava a esperar seis meses para falar. A Assembleia duplicou de tamanho da minha primeira passagem para agora, no ponto de vista físico. Há muitos avanços, mas no ponto de vista do poder e das prerrogativas do Legislativo, a Assembleia tem muito a fazer.
Existem certos gargalhos de inoperância na questão da feitura das leis. E apenas agora a Casa começa a se abrir para a participação popular. Eu participei de três audiências públicas recentemente: uma sobre Regiões Metropolitanas, uma com o ministro da Educação e outra do Rodoanel. Foram três audiências públicas com muitas presenças, mas a Assembleia está longe de ser um poder com a autonomia que lhe compete. E precisamos aperfeiçoar essa situação. Isso é genérico nos poderes legislativos, mas estou falando nesse onde hoje estou. Por exemplo, a lei em vigor das regiões metropolitanas, eu votei em meu primeiro mandato em 1987. De lá para cá muita coisa mudou, e essa lei só voltou a ser discutida agora, sendo que há projetos nesse sentido desde 2005. Existe morosidade na política e isso não pode acontecer.
JB- Você passou por uma experiência, acredito que inédita no Brasil, de em apenas três meses passar pelas três esferas legislativas: a municipal como vereadora, a estadual e a federal. Como foi mudar de gabinete uma vez por mês?
TS- Eu tive uma sorte de ter sido deputada federal por três mandatos. Ao assumir como suplente agora já tinha experiência o que facilitou esse mês de trabalho. Ao retornar à Câmara Municipal em 2009, eu retornei as minhas raízes e pude estar praticando o exercício do parlamento, pois a essência dos três poderes é a mesma, o que diminui é o espaço para o parlamento, da discussão, da fala no plenário. O mais difícil dessa experiência foi o fuso horário. Do Centro do Brasil, para o nível do mar e depois para o Planalto. Isso é muito complexo.
JB- Em qual dessas três casas a senhora se identifica mais?
TS- Elas são similares, cada uma tem seus aspectos positivos e negativos. Eu diria que no Município você se relaciona com os problemas cotidianos, na Câmara Municipal você acaba tendo a proximidade física com seus eleitores e com a população e isso é fantástico. Para uma pessoa como eu, do jeito que me comporto na vida, acho esse contato insubstituível. Em Brasília, você tem a visão de todos os constrates desse país, que é um continente. Lá você aprende a compreender as razões do Norte, do Nordeste, a pujança do Sul e todas as diferenças regionais. Em São Paulo, você está à frente do Estado locomotiva. Você trabalha mais com estatística do que com as pessoas. As três casas tem pontos interessantes, mas talvez o fato de estar na minha Cidade, poder dormir na minha casa todos os dias seja tentador. Não que seja melhor, mas é mais gostoso, do ponto de vista pessoal.
JB- Você se considera uma liderança popular?
TS- Sim, acho imprescindível esse contato com as pessoas. Saber delas o que pode ser feito pelo Poder Público, seja ele Executivo, Legislativo ou mesmo Judiciário para melhorar sua qualidade de vida. Isso é fantástico. É ótimo.
JB- Com a saída do Paulo Alexandre e do Bruno Covas para o secretariado do governador Alckmin, você acabou como única representante da Baixada na Assembleia. Acredita que terá dificuldade sendo a única representante da região e ainda membro da oposição em fazer valer a força da Baixada no Estado?
TS- No meu primeiro mandato na década de 80 também foi assim. Mas, posso ser oposição em São Paulo, mas sou situação em nível federal. Eu acabo me tornando, pela condição que a vida me impôs, um elo entre meu Estado e a Federação. Eu diria que sou o elo que une a Região Metropolitana, o meu Estado e o Governo Federal. Seja porque conheço a maioria dos ministros, seja porque fui deputada federal, e seja também porque sou do PT. Se vou representar bem, é uma tarefa imensa. Uma honra. Mas não espero fazer isso sozinha. Eu conto com parceiros, como as ONGs, as organizações de servir, os Rotarys, os Lions, as associações de um modo geral que são sempre parceiras e agora mais do que nunca. É muita honra, mas também muita responsabilidade.
JB- A saída do Paulo Alexandre e do Bruno Covas, na sua opinião, diminuiu a representatividade da Baixada na Assembleia ou eles como secretários podem atuar melhor pela Região?
TS- São duas questões. Na questão pessoal, eles tiveram uma ação que os beneficiou de forma particular. Do ponto de vista da representação legislativa é óbvio que enfraqueceu. Enfraqueceu a discussão política, a possibilidade de emendas e a representatividade. Eu espero que como secretários eles possam trazer outros avanços para a Região. Mas um secretário estadual é de São Paulo como um todo, e não apenas da Baixada.
JB- Quais os principais temas da Região que você quer discutir na Assembleia?
TS- Eu fui eleita a quarta secretária da mesa diretiva da Assembleia. A única mulher na mesa, o que é uma honra. E acabei de ser nomeada membro efetiva da Comissão de Educação e Cultura e da Comissão de Assuntos Desportivos e Lazer. Sou suplente na Saúde. Os meus trabalhos versarão nessas questões. Já criei duas frentes parlamentares, uma pró-mobilidade urbana de Santos e Região, na qual já realizamos uma audiência pública. e uma de Santos como subsede da Copa de 2014. Quando escolhi a mobilidade urbana como primeira ação política foi porque não há tema mais moderno no mundo. Significa trânsito, transporte de passageiros e de carga, significa o nosso porto, VLT, a ligação seca com Guarujá, os gargalhos na entrada de Santos, a aposta na hidrovia como transporte de passageiros. Eu tenho a seguinte crença. Não dá para ter uma explosão imobiliária sem um planejamento que a acompanhe. Senão vira o caos. Basta ver o que acontece com o trânsito aqui de Santos.
Ainda não se planejou nossa região com esses impactos. Nem mesmo se planejou a região metropolitana como um todo. Não dá para Santos ser uma ilha de excelência aparente e você criar bolsões de pobreza no entorno. E é o que está acontecendo. Somos uma Manhattan mal acabada, uma Manhattan "la cucaratcha". Precisamos de um planejamento urbano estratégico das nove cidades, com um crescimento harmonioso entre elas, com qualidade de vida como um todo. É o meio ambiente, a mobilidade, a qualidade de vida e é a cidadania plena, sem exclusão de setores sociais como está acontecendo. Ao lado dessas questões eu falo de Educação, Saúde, Cultura, Esporte, Lazer, e é inevitável falarmos do pré-sal. Na eleição de 2000, eu fui desqualificada e ridicularizada por opositores que poderiam ter preparado a região para essa novidade do pré-sal e não prepararam e agora defendem o tema. Com essa pujança material e a decisão do Governo Federal de criar uma estatal estilo dinamarquesa, com 12 a 15 pessoas, para administrar o que for extraído do pré-sal e o percentual que vai para as questões sociais, é preciso juntar as duas pontas, a pujança material e a questão social, para que você não tenha uma visão distorcida do desenvolvimento humano.
Estou também muito feliz, pois estamos discutindo na Assembleia um novo conceito de Região Metropolitana, que tenha um fundo de desenvolvimento, participação popular, planejamento e gestão eficaz e eficiente. Vamos fazer uma audiência pública sobre isso aqui na Baixada. Quero defender a criação de consórcios que unam o município, o Estado e a Federação. Por exemplo, obras como o VLT demanda uma extraordinária quantia financeira e não é justo que apenas alguns municípios banquem esse projeto. O Estado e a Federação tem que entrar também. Temos que evoluir para esse consórcio. Em resumo, quero nortear meu mandato na missão de juntar a pujança material da Região, com o porto, o turismo de transatlânticos e o pré-sal, em uma integração harmônica com políticas públicas sociais. Quero melhorar a qualidade de vida da Região como um todo.
JB- O PT acabou perdendo espaços que possuía na Assembleia e na Câmara Federal. E o partido em Santos sempre se formou em torno de sua imagem. Existem muitos militantes que votam na Telma e não no partido, é possível dizer que você é uma espécie de Lula do PT da Baixada?
TS- Antes fosse, não é assim. O PT já teve quatro deputados: dois federais e dois estaduais. Eu e a Mariângela Duarte na Câmara Federal e a Maria Lúcia Prandi e o Fausto Figueira na Assembleia. Nenhum partido conseguiu isso por tanto tempo. Eu penso que há um equívoco na avaliação que diz que o PT perdeu. Na verdade, a legenda tinha uma explosão de parlamentares nunca vista. Mas, a Mariângela saiu do partido e foi para o PSB. O Fausto e a Maria Lúcia não se elegeram nesse último pleito, mas em compensação temos três vereadores em Santos, quatro em Cubatão, um em Bertioga, dois em Guarujá, um em São Vicente, uma vereadora em Peruibe e uma em Itanhaém. Temos também a prefeita de Cubatão, Márcia Rosa, temos uma prefeita no Vale do Ribeira, o vice-prefeito de Pedro de Toledo, não é pouca coisa. E temos aliados como a prefeita do Guarujá, Maria Antonietta.
Temos sim muita força regional. Mas antes tínhamos uma estupenda representatividade. Como só fiquei eu dos deputados, em um primeiro momento eu fiquei acudida, mas depois pensei, é claro que seria melhor se eles fossem eleitos, mas de qualquer maneira somos uma força regional. Acho que me sobressaio por ter sido prefeita da cidade pólo. Não eu, mas a equipe. Mas todo mundo lembra do nome da prefeita, mas foi uma administração de equipe. Nossa equipe saiu da Prefeitura com 97% de aprovação do Ibope do Datafolha. Quem levou a honra foi meu nome, mas quem fez o trabalho foi uma equipe de muita competência, tanto que meu sucessor foi o secretário de Saúde, David Capistrano. Talvez por isso eu seja apontada como uma referência do PT na Baixada. Foi por ter sido prefeita.
JB- Há muito tempo você não dá aula, não? O que você levou para a política das lições de sala de aula?
TS- Você está enganado. Eu tenho dado aula na pós-graduação da Unimonte. São módulos, já são três turmas que eu formei, são dois meses de aula. E que maravilha. Acho que o que sou da vida é mesmo professora. Quanto às lições de sala de aula, posso dizer que essa experiência foi tudo na minha vida política. Ouve os alunos que você ouvirá a população. Ouve que o resultado é sempre positivo.
JB- Você já teve adversários políticos dos mais diversos, como o Paulo Gomes Barbosa, o Oswaldo Justo, o Del Bosco Amaral, o Vicente Cascione, o Beto Mansur e o próprio prefeito Papa. A senhora participa da vida política da Cidade desde a retomada da autonomia, já que disputou a eleição de 1984, que foi vencida pelo Oswaldo Justo. Como você consegue sobreviver como uma das principais personagens políticas de Santos há pelo menos 30 anos?
TS- Não tenho a menor ideia. Mas, eu tive pais políticos. Meu pai, João Inácio de Souza foi vereador cassado, minha mãe Hilda de Souza também foi vereadora e fundou o MDB. Meu pai foi amigo pessoal do Esmeraldo Tarquinio, do Oswaldo e do Emílio Justo, do Oswaldo De Rosis, do Noé de Carvalho, do Fernando Oliva. Esse pessoal frequentava muito minha casa quando eu tinha uns 10 anos. Eu tenho heranças que vieram dos meus pais. Mas, por outro lado, se alguma qualidade eu posso ter é que eu não misturo a questão política com a questão pessoal, é muito difícil.
As pessoas que são protagonistas da política sabem que em momento nenhum eu invado o lado pessoal dos adversários, o que não quer dizer que a recíproca seja verdadeira. Mas eu cuido para o embate não passar para o lado pessoal, por ter consciência e acho que por ser mulher. Cuido para não misturar o público o privado na vida pessoal, na discussão política e nos postos que tenho ocupado. Claro que não vou ao cinema com meus adversários, mas eu cuido para que nenhuma discussão seja pessoal. Discussão tem que ser no campo das ideias. Acho que por isso sobrevivo tanto tempo.
JB- O cientista político Fernando Chagas em uma entrevista para o Boqnews fez uma análise dos partidos visando 2012. Na opinião dele, o PT deve buscar a união de seu grupo com o grupo cuja principal liderança é o ex-deputado Fausto Figueira para buscar uma nova liderança para ser candidato do partido a prefeito de Santos em 2012, para passar a ser conhecido da população, com novas ideias e propostas, construindo chances reais buscando a eleição de 2016. O que a senhora pensa dessa análise?
TS- O partido ainda nem começou a discutir a próxima eleição. O que acontece com a política. Veja o caso do Sarney. Gostamos ou não dele, ele lutou contra a ditadura do jeito dele. O Antonio Carlos Magalhães já não. E o que acontece. O PSDB se junta ao ACM, ao antigo PFL. Mas quando o PT se junta ao Sarney vira um escândalo. O PMDB lutou contra a ditadura. O que isso tem haver com a pergunta. É o seguinte. Eu penso que precisa haver uma composição PT e PMDB, sem esquecermos o PSB e as outras legendas que dão sustentação ao Governo Federal. Não sou eu que estou querendo essa aliança. Ela foi definida por escolhas locais anteriores. Claro que quem fica fora das escolhas se junta. Mas essa é uma discussão que estamos começando a discutir no PT.
O PMDB já deu outros sinais e tomou outras decisões internas. Não podemos esquecer que o PT é o partido da presidenta da República. Temos que ter representatividade muito enérgica em todo o Brasil, não só na Baixada Santista. E procurar compor com nossos aliados nacionais. Vamos ver como vai ser a discussão dentro do PT. Recentemente tivemos uma reunião em Osasco dos deputados estaduais, federais, prefeitos e os presidentes de Macro-Região para discutir esse tema com a presença do Luis Ignácio Lula da Silva. Logo teremos novidades, sem candidaturas que são balões de ensaio, sem consistência. O PT tem quadros políticos com experiência, em construção e também possui quadros que precisam ser construídos. Essa discussão precisa ser aprofundada no momento certo. Eu mesma não estou pensando nisso agora.
JB- O PMDB e o PT em Santos sempre foram antagônicos desde a volta da autonomia em 1984. A senhora acredita mesmo em uma composição entre as duas legendas?
TS- A política não é algo estático. Cada momento há uma correlação de forças e uma conjuntura. A disputa que vai se dar em 2012 vai ser no décimo ano do PT e seus aliados na Presidência da República. É outra conjuntura que evidentemente vai se refletir nos Estados e nos Municípios. Os dois partidos tem muita representatividade. Quem vai ser o cabeça de chapa é cedo para discutirmos, pois temos mais de um ano para a eleição. É no andar da carroça que as abóboras se acomodam. É muito cedo ainda para qualquer decisão. Mas a tendência é seguimos a composição nacional.
JB- Voltando ao cientista político Fernando Chagas, ele acha que o PT santista vive o mesmo dilema do PSDB nacional de não conseguir construir uma alternativa viável de oposição. Você concorda com esse paralelo?
TS- Ele está enganado. Nós tínhamos quatro vereadores em 21 membros da Câmara e três com 17 vereadores. Isso é uma força de oposição. As administrações em Santos têm sido muito conservadoras. Mas não será para sempre, pois as pessoas pensam. Acho que está cedo para discutirmos a eleição de 2012. Até porque tem novas conjunturas, vem ai o prefeito Kassab com o novo PSD, que já é uma modificação na balança nacional. Acho que eleição tem muita força nas ideias, mas também a parte financeira pesa. No entanto, eu acho que vai se dar melhor quem pensar a região de uma maneira generosa e integra. Quem pensar assim sai com vantagem.
JB- Você não acha que com a divisão das forças que apoiam o governo Papa, as chances do PT serão maiores. Haja vista que pelo menos já temos quatro a cinco candidatos saindo da base do Governo?
TS- Eu acho que no final isso não vai pesar. Pois no final haverá uma polarização entre oposição e governo. Não importa quantos candidatos teremos dos dois lados. O futuro há deus pertence! Será uma eleição interessante.
JB- Você acha que será fácil o PT manter as três cadeiras que possui hoje na Câmara Municipal sem seu nome estar na chapa dos vereadores. Afinal, a senhora na última eleição foi a vereadora mais votada na história da Cidade?
TS- Com toda a certeza. O PT tem uma boa bancada, com o professor Reinaldo Martins, a vereadora Cassandra Maroni, que está no quarto mandato, tem um jovem como o Adilson Júnior, que é uma surpresa para nós e outras novas pessoas que estão vindo para o PT e que vamos apresentar seus nomes na hora certa. Acho provável que vamos conseguir aumentar nosso número de vereadores.
JB- Que balanço você faz da Prefeitura de Santos desde a saída do PT do Governo, em 1996, até agora?
TS- A parte negativa, que é bem dramática, é a ausência de um planejamento integrado dos diversos setores de políticas públicas e integrar a Cidade com a Região. Isso é muito grave. Programas de Saúde Mental, Aids deixam a desejar. O ponto mais fraco é a Saúde. A Educação se esforça, mas também não dá resposta. Estou falando genericamente. Penso que não houve a busca por políticas públicas mais de vanguarda, como houve nos períodos em que o PT governou. De positivo, temos o pré-sal, embora a Cidade não tenha se preparado para isso. Não podemos virar uma Macaé. Faz doze anos que falo sobre isso. Eu acho que a preparação para esse estágio do pré-sal se deu de uma maneira material muito eficiente. Mas tem que se dar também nas questões sociais, por qualidade de vida. O grande boom positivo é o turismo, que precisa também ser melhor trabalhado. Tem também a recuperação do Centro Velho que foi muito interessante.
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